Empoderamento no samba: conheça mulheres que desbravam o gênero musical e desafiam o machismo no Maranhão

  • 14/04/2024
(Foto: Reprodução)
Em homenagem ao Dia Nacional da Mulher Sambista, celebrado nesse sábado (13), o g1 MA trouxe histórias de mulheres que não baixaram a cabeça para o machismo dentro do samba e se tornaram grandes vozes representativas no Maranhão. Sambistas maranhenses que não baixaram a cabeça para o machismo no samba e ocupam lugares de destaque no MA. Reprodução/Arquivo pessoal Cantar as lutas e celebrar as vitórias das mulheres no samba. Foi com essa finalidade que o dia 13 de abril, primeiro Dia Nacional da Mulher Sambista, comemorado nesse sábado, teve origem. Sancionada pelo presidente Lula no início deste mês, a data põe em evidência uma luta que já dura há décadas no Brasil: o esforço de mulheres para serem vistas, respeitadas e ouvidas no mundo do samba. No Maranhão, as mulheres que fazem parte dessa luta por mais visibilidade compartilham, por meio da música, suas vivências de resistência nas ruas, praças e outros locais públicos e privados do estado, mostrando seu talento e motivando outras mulheres a ingressar na luta. Compartilhe essa notícia no WhatsApp Compartilhe essa notícia no Telegram Como forma de inspirar e cooperar com a causa, o g1 MA trouxe histórias de vida de duas sambistas maranhenses, que levaram a sério o pedido de “não deixar o samba morrer” e, hoje, vivem da profissão “não tendo a vergonha de ser feliz”, enfrentando as vozes que tentam anulá-las. Das raízes aos frutos Vivendo pelo samba desde a infância, a Rainha de Bateria da Favela do Samba de São Luís, Millena Mendonça, conta que desde criança o gênero musical corre pelas suas veias e faz parte de sua vida. Ao g1 MA, ela contou que começou a carreira aos 14 anos, cantando pelas praças da capital maranhense. “Eu canto desde os meus seis anos de idade, profissionalmente desde os quatorze, na Praça Nauro Machado. Eu sou o que minha criança sonhou ser”, disse Millena. Nas programações de rua não faltavam alegria e acolhimento, o que, segundo ela, podem representar muito bem as rodas de samba, onde todas as pessoas são bem-vindas e chamadas para entender mais sobre as lutas do povo negro, que reivindicam locais de fala mais abertos e altivos. Millena Mendonça começou a cantar samba desde pequena. Ela sempre sonhou em ser cantora. Reprodução/Arquivo Pessoal “Eu aprendi a conviver com pessoas de verdade cantando na praça, porque na Nauro Machado você olha de tudo, desde o empresário até o marginal que passa por ti e acha o teu trabalho massa. O samba é marginal, ele é periférico, é uma coisa de rua, o samba ele foi feito de preto”, relata a sambista. Leia também: Bambas do samba: no Dia Nacional da Mulher Sambista, mulheres cobram mais visibilidade nas rodas de samba no MA Hoje, aos 28 anos, Millena diz estar vivendo aquilo que sempre sonhou e almejou quando ainda era criança. Ela conta que desde muito nova sempre sonhou em ser cantora e correu atrás da realização deste sonho. Nas atividades da escola, quando era perguntada sobre o que queria ser quando crescer, a resposta era certa: queria ser cantora. Ao olhar para trás, Millena afirma estar realizada por ter conseguido alcançar aquilo que sempre quis. “O caderninho de quando eu era do terceiro período que minha professora me mandou, tinha desenhos de 'o que que você quer ser quando crescer', eu escrevia que queria ser cantora e hoje eu sou”, disse a sambista. Desafios impostos Mas a realização deste sonho veio acompanhada de alguns desafios que logo ela teria que enfrentar para se manter no caminho que havia traçado. Dentre eles, Millena destaca a falta de conhecimento que as pessoas têm sobre a influência de mulheres na origem e no fortalecimento do samba no estado e como isso acaba anulando as vozes femininas. O samba, que é majoritariamente composto por homens, ainda é considerado um campo de batalha para as mulheres. No Maranhão, Millena pontua que o machismo dentro do gênero também é algo muito latente e lamenta ter que passar por várias penúrias para ser reconhecida. “O samba é feito por mulheres, mas ele é muito machista também. Esse lugar de deslegitimar o que a gente fala tá tão intrínseco, né? São coisas visíveis. Eu vejo grupos de mulheres daqui que os homens fazem piada, dizendo que elas não sabem fazer samba, como se só eles soubessem. Se tu for mulher, tu tem que provar que tu sabe fazer”, comenta. Millena Mendonça no espetáculo 'Marrom", em homenagem a Alcione, rainha do samba. Reprodução/Arquivo pessoal Além da questão de gênero, existe a questão racial. Como mulher negra, ela relembra a origem do samba, que nasceu das comunidades pobres e negras do Brasil. Ela diz que o estilo musical “está perdendo esse lugar do periférico e se embranquecendo para que ganhe valor”. Millena é firme ao destacar as lutas que os primeiros sambistas tiveram que enfrentar para serem aceitos no Brasil e consolidar o samba. “O samba é lugar de muita luta, de muita resistência, de muito letramento, tanto racial quanto outros tipos de letramento. Se fosse hoje uma Patativa, uma Leci Brandão, um Bezerra da Silva, uma Pérola Negra, essa galera não tinha vendido não. Não tinha espaço pra eles”. Sambando na cara do machismo Embora tenha passado por vários contratempos que tentaram desmotivá-la e silenciar seu canto, Millena encontrou um jeito de se fazer ouvida e respeitada. Ela conta que foi preciso enfrentar todos esses problemas acreditando em si mesma e fazendo um bom trabalho. Vivendo com determinação sua trajetória no samba, se expressando por meio da música e na dança, ela explica que se segurou na história de outras mulheres que vieram antes dela para tirar força para enfrentar o machismo e ocupar o espaço que almejava alcançar. “Eu enfrento muito esse machismo me segurando em mim mesma e segurando em todas as mulheres que já vieram antes de mim. O que eu faço é mostrar que eu sou boa fazendo, sabe? Eu sei o que eu tô fazendo. Por diversas vezes, eu já fiz coisas com muito medo, mas eu passava tanta segurança que até eu acreditava que eu estava segura”, explica Millena. Millena vestida de passista para o desfile na Passarela do Samba de São Luís. Reprodução/Arquivo pessoal Hoje, reconhecida nacionalmente pelos trabalhos de passista e cantora de samba, ela colhe os frutos de todas as provações que teve que enfrentar ao longo da carreira para atingir seus objetivos. Uma das conquistas na vida de Millena foi ser escolhida para representar o Maranhão no estado do Rio de Janeiro, na Primeira Associação de Passistas do Brasil (APASB), sendo a primeira maranhense a ocupar este posto de conselheira na organização, que tem como finalidade “preservar, difundir e fortalecer a arte da dança do Passista do samba e defender os seus direitos enquanto artistas”. “Eu sou conselheira nacional de passistas. Meu nome é pautado no Rio, tem uma pauta na APASB, é a Primeira Associação de Passistas do Brasil e eu sou conselheira do Maranhão e isso é muita coisa”, disse Millena. “Deixo à sambista mais nova o meu pedido final” Os entraves são grandes, mas não foram suficientes para estagnar o projeto de vida da sambista. Ela afirma que é preciso enfrentá-los reconhecendo sua própria força e acreditando em si própria, para não abaixar a cabeça para quem quer desacreditar no seu trabalho. Para as meninas que almejam escolher o samba como carreira e se tornar as novas vozes do samba maranhense, Millena diz ser fundamental acreditar em seu potencial e não ligar para o que as pessoas que não gostam do seu trabalho podem dizer. “Se você acredita no que você faz, não permita com que outras pessoas te coloquem no lugar de invalidez, porque a descrença delas em você é com elas, elas não creem no que elas podem fazer, porque essa chama de arte, do samba, de viver essas coisas é muito nossa. Então outra pessoa não pode viver o que você quer viver para si”, finaliza Millena. O samba como herança Outro grande exemplo de destaque e empoderamento no mundo do samba é a cantora maranhense Fernanda Garcia, de 47 anos. A sambista, que vive em São Luís, conta que o amor e a afeição pelo gênero musical vieram de berço, herdando do pai a dedicação e zelo pela música, tido com sua primeira referência musical. Fernanda Garcia já foi chamada para cantar em vários lugares fora do Maranhão. Reprodução/Arquivo Pessoal “Minha referência no mundo da música é, primeiramente, meu pai que tinha uma bela e potente voz. Minha trajetória no samba começou desde pequena, com as serenatas e encontros que ele fazia. No início de minha carreira, aos poucos, sambas eram introduzidos no repertório e minha afeição e amor só aumentavam”, disse Fernanda. Ao g1 MA, a artista contou que tem como missão levar o samba para as pessoas que ainda não conhecem o estilo musical e o que ele representa. Ela compartilhou sua jornada Brasil afora, onde alcançou vários lugares sempre guiada pela música. Carreira consolidada Sendo chamada para se apresentar em outros estados brasileiros, como em São Paulo e no Rio de Janeiro, Fernanda não hesita ao demonstrar a felicidade de ter escolhido o samba como a profissão que vai levar para a vida toda. Para ela, ter a oportunidade de ser chamada para cantar em vários lugares fora do seu estado de origem e levar a sua arte para outras pessoas é um motivo de grande satisfação. Por meio do samba, Fernanda diz que encontrou um jeito de se conectar com seus ancestrais e representar o público feminino que a acompanha em suas agendas. Cantora Fernanda Garcia é exemplo de empoderamento feminino no mundo do samba “Participei de várias rodas de samba, como a Roda de Samba Gloriosa, O Samba do Trabalhador [no Rio de Janeiro]. Cantei nos encontros das Mulheres Sambistas, no grupo das Mulheres na Roda de Samba. Daí em diante, o samba chegou de vez em minha vida. Posso dizer que me encontrei com esse estilo, que me faz cantar com toda representatividade, com a força e garra que vem da raiz dos meus ancestrais”, contou a sambista. A dedicação ao samba a levou a alcançar lugares ainda maiores na carreira. Além das apresentações nos festivais de música, Fernanda é dona de gravações premiadas, como a “Força da Fêmea”, em participação de Ivan da Gamboa, e “As Cartas Não Mentem”, disponíveis nas plataformas digitais. Ela até recebeu o prêmio de música mais tocada pela Rádio Universidade, no MA. Por mais espaços nas rodas de samba Apesar de todo reconhecimento e das conquistas, Fernanda lamenta as situações que as mulheres sambistas são obrigadas a passar para serem reconhecidas no Maranhão. Comparando a cidade de São Luís com outros lugares que já se apresentou, ela diz que um dos maiores desconfortos que vivenciou, causado pelo machismo, foi na capital maranhense. “O machismo dentro do samba sempre existiu, porém sinto que os maiores casos eu passo são aqui em São Luís. As mulheres sambistas estão crescendo aqui. Porém são poucas que se destacam e chamadas para participar das rodas. Os cachês oferecidos ainda são menores que dos homens. Eu vivi recentemente isso em relação ao cachê’, comenta a cantora. Ela complementa dizendo que os organizadores de shows, e até mesmo a sociedade, “deveriam estar mais abertos para receber as mulheres no samba e oferecer oportunidades de trabalho mais igualitárias para todos da área, não apenas para um grupo fechado de artistas já consolidados em São Luís”. Embora sejam raros os lugares onde mulheres podem exercer sua vocação de ser uma voz ativa do samba na cidade, Fernanda aponta que o “cenário do gênero está em evolução em relação aos artistas que estão aparecendo”. Para ela, isto é algo visto como positivo, mas conta que ainda são poucos lugares onde essas oportunidades são oferecidas. A fé como guia As lutas para se solidificar no ramo do samba são constantes. Mas, para enfrentar todas essas dificuldades, Fernanda conta que é preciso ter fé, para ser maior que os problemas e se assegurar na história de força de outras mulheres que vieram antes para abrir os espaços hoje ocupados. “A força e a fé nunca me abandonaram. Você precisa de coragem para correr atrás dos seus sonhos, sair sozinha, enfrentar uma cidade que não é sua. Ser mulher e sambista requer muita determinação. Sempre respeitei quem veio antes de mim e sabendo o meu lugar e onde posso chegar”, compartilha Fernanda. Fernanda conta que é preciso ter fé, para ser maior que os problemas e se assegurar na história de força de outras mulheres. Reprodução/Arquivo pessoal Mesmo com as dificuldades enfrentadas pelas mulheres do samba atreladas ao machismo, que tentam anular suas visões de mundo dentro do gênero musical, o conselho de Fernanda às mulheres e meninas que querem seguir a carreira de sambistas é fazer as coisas com amor, estudo e disciplina. Além dos estudos, ela conta que o segredo para ter uma vida bem-sucedida no ramo é nunca desistir e sempre lutar. “Meu conselho às mulheres e meninas que querem seguir no samba é que tenham disciplina com estudo e amor ao samba, você chegará bem e será aceita pelo seu conhecimento e potencial. Seja verdade, saiba o que você quer e não desista nunca, assim você terá muitas chances de ter boas oportunidades de alçar altos voos em sua carreira de sambista”, finalizou a cantora. *Estagiário supervisionado por Liliane Cutrim.

FONTE: https://g1.globo.com/ma/maranhao/cultura/noticia/2024/04/14/empoderamento-no-samba-conheca-mulheres-que-desbravam-o-genero-musical-e-desafiam-o-machismo-no-maranhao.ghtml


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